Há não muito tempo eu assisti um vídeo de um canal no youtube que eu gosto muito que se chama Sociocrônica (inclusive recomendo), basicamente eles abordam questões, nenhum pouco óbvias, presentes na cultura pop e nesse em específico eles trataram do race coding e como ele se manifesta principalmente em desenhos animados. Meu objetivo nesse texto não é falar do que eles já falaram até porque o vídeo é extremamente completo, mas eu quero trazer meu olhar que se parte da visão de uma mulher preta sobre essa questão e refletir um pouco mais.
E afinal, o que é race coding? Bom, acho que com meus exemplos acima fica bem mais fácil de entender que consiste em personagens de desenhos animados que de alguma forma com seus trejeitos, modo de falar ou características físicas denotam algum teor não branco como parte da sua própria identidade. Sem dúvidas, um dos exemplos mais clássicos que temos é o próprio Piccolo do anime Dragon Ball, que já até se tornou objeto de estudo no livro "Piccolo Is Black: A Memoir of Race, Religion, and Pop Culture", onde o autor Jordan Calhoun reflete acerca da ferramenta de representatividade que existe nesses personagens supostamente não brancos e também no impacto que isso causa na construção da identidade de crianças negras e o olhar que adquirem sobre si mesmas.
Nesse sentido, a falta de representatividade também impacta muito negativamente na autoestima desses sujeitos que desde cedo são tidos como exóticos, feios ou anormais, ou seja, estigmatizados por uma sociedade estruturalmente racista, que exclui todo aquele que foge dos padrões vigentes. Dessa forma, não é incomum ouvirmos frases do tipo "estão querendo enfiar raça em tudo" quando nos referimos a personagens possivelmente racializados, mas por que isso ocorre? A resposta é bem óbvia, ocorre porque o padrão da nossa sociedade é branco. Ou seja, pessoas brancas são enxergadas como "normais", são os sujeitos universais e quando alguém escapa desse padrão é relegado à abjeção e por isso esses indivíduos percebidos como "universais" tem TANTA dificuldade de se enxergarem como pessoas racializadas. Se você é branco e tá lendo esse texto sinto te informar... mas você também é uma pessoa racializada e não uma folha de papel pura que veio ao mundo.
Essa dificuldade de se enxergar como portador de uma raça provém justamente do lugar do branco na nossa estrutura social, porque assumir essa identidade de pessoa branca querendo ou não também vem com o entendimento de que você possui vantagens em relação a pessoas não brancas na nossa sociedade, até porque a nossa atual estrutura trabalha continuamente para privilegiar pessoas como você. Então, respondendo ao comentário acima: raça já está em tudo!!, desde quando optam por um elenco de série majoritariamente branco ao momento que fazem um live action adaptado com uma atriz negra. Para finalizar esse texto, eu gostaria de citar uma frase da estudiosa Djamila Ribeiro contida no livro "Pequeno manual antirracista" que perfeitamente exemplifica o que dissertei aqui:
"Trata-se de refutar a ideia de um sujeito universal — a branquitude também é um traço identitário, porém marcado por privilégios construídos a partir da opressão de outros grupos. Devemos lembrar que este não é um debate individual, mas estrutural: a posição social do privilégio vem marcada pela violência, mesmo que determinado sujeito não seja deliberadamente violento."(p.33)
Eu espero que esse texto tenha ajudado a introduzir o conceito de race coding, algumas ideias sobre raça e em especial em deixar tal conceito em evidência, visto que achei pouquíssimas pessoas tratando sobre aqui no Brasil, principalmente no âmbito acadêmico. Obrigada pela atenção <33
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Link do maravilhoso vídeo do Sociocrônica sobre race coding: https://youtu.be/4kS28vNY68E?si=9XzYFGSHAkRk1xo6.

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