The Boys com certeza se tornou uma das minhas série favoritas, principalmente porque eu nunca fui chegada em temáticas que abrangessem personagens voltados para figuras heroicas, já que não sou nenhum pouco geek e não tenho costume de consumir produções cinematográficas desse tipo. Nesse sentido, a série me impressionou muito, em especial, porque eu não estava esperando muito dela devido a minha falta de proximidade com esses conteúdos. Além disso, eu já tinha visto nas redes sociais um pouco sobre o que a série buscava retratar e a representação que a mesma fazia do imaginário fascista, centrada no personagem do capitão pátria e suas ações.
Meu objetivo nesse texto não é dar spoilers, mas já aviso que é provável que isso aconteça pois preciso me utilizar de determinadas situações da série para fazer minha análise do personagem em questão. Porém, reafirmo que meu objetivo é fazer uma leitura, proveniente de uma mulher negra socialmente consciente, acerca do Capitão Pátria e como ele é a personificação mais exata da autoestima do homem branco e sua síndrome de protagonista. Para aqueles que nunca assistiram The Boys, o Capitão Pátria é o líder do grupo de heróis denominado “Os Sete”, responsáveis por combater a criminalidade na cidade e também, em situações específicas e mais alarmantes, no país.
Contudo, em alguns momentos você percebe o fetiche do personagem por controle e principalmente pela sensação de ser adorado e ser tido como a figura central da Vought, empresa responsável por administrar a carreira dos heróis. Acredito que isso se dá devido a sua total adesão e pertencimento a estrutura patriarcal, racista e lgbtfóbica que faz com que ele entenda que por ser um homem cis, branco, hétero e principalmente com super poderes (literalmente), deva ser privilegiado em todas as situações possíveis e detentor de todo prestígio social.
Consequentemente, em momentos de contrariedade quando as coisas não saem como o personagem espera ou quando ele é traído, seu mundo cai completamente e o faz questionar como tais ações são passíveis de acontecer com uma pessoa como ele, pois o mesmo espera que todos o devotem de maneira espontânea. Conforme eu assistia a série, eu conseguia reparar em padrões de comportamento presentes não só no Capitão Pátria, mas em pessoas privilegiadas pela estrutura social e pelos setores hegemônicos, que apresentam comportamentos repletos de senso de impunidade. Como aquela estudante de medicina da USP que desviou o dinheiro da formatura e só tempos depois foi condenada a cinco anos de prisão que poderão ser cumpridos em regime semiaberto. O que nos faz questionar se o tratamento pelas instituições públicas seria o mesmo caso fosse uma mulher preta periférica tendo o mesmo tipo de conduta.
Mas esse texto tem como finalidade centralizar sua análise nos sujeitos masculinos abarcados pelo patriarcado e pela branquitude, que não só possuem uma autoestima extremamente alta, porque tiveram essa construção desde os momentos iniciais da vida, mas também por meio disso reproduzem violências e abusos. Como o próprio Capitão Pátria fez com a esposa do Billy Brutus quando a violentou e também quando manteve a Maeve aprisionada pelo seu segredo relacionado a sua sexualidade e que posteriormente ele expôs isso para o mundo da forma mais irresponsável possível.
Dessa forma, quando assistimos The Boys percebemos que existe uma estrutura que vai criando e reproduzindo figuras como a do Capitão Pátria. Sem dúvidas, a série possui um papel crucial através de seu enredo de exemplificar as mazelas do nosso corpo social, que possui muita responsabilidade na criação desses homens que crescem acreditando fielmente que são os personagens principais da história do mundo e que as instituições, seja ela qual for, devem se curvar as suas necessidades e atender as suas demandas simplesmente por serem incluídos pelo modelo fenotípico hegemônico e possuírem algum tipo de poder aquisitivo.
Assim, eu encerro esse texto com a importante frase da estudiosa Cida Bento, em sua obra O pacto da branquitude acerca da nossa sociedade estruturalmente racista: “Fala-se muito na herança da escravidão e nos seus impactos negativos para as populações negras, mas quase nunca se fala na herança escravocrata e nos seus impactos positivos para as pessoas brancas.”.
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